O MPLA E OS PARTIDOS PORTUGUESES

O reforço da cooperação com os partidos portugueses no domínio da formação, troca de experiência e do fortalecimento dos laços de amizades consta nas prioridades do MPLA, afirmou, em Lisboa, o secretário do Bureau Politico para Organização e Inserção na Sociedade, Gonçalves Muandumba.

Por Orlando Castro

De acordo com a Angop, o político fez esta afirmação à margem de um encontro com a direcção do Partido Comunista Português (PCP), no âmbito de uma visita de trabalho de uma delegação do MPLA a Portugal.

De acordo com Gonçalves Muandumba, as relações entre o MPLA e o PCP (pai do MPLA) são de longa data, daí estar-se a aproveitar a estadia da delegação angolana para a troca de informações, actualização de experiências e intercâmbio com a formação política portuguesa. Valorizou o facto de, apesar de Portugal estar em campanha eleitoral, a direcção do PCP mostrar-se disponível em receber a comitiva angolana.

Por outro lado, Gonçalves Muandumba referiu que durante a sua estadia em território luso manterá um encontro com a comunidade que o MPLA considera ser angolana residente em Portugal, a fim de auscultar os seus maiores problemas.

Acrescentou que uma das prioridades do MPLA é aproximar mais a comunidade angolana (com a óbvia excepção dos que não são do MPLA e dos que pertencem à quase extinta “etnia” dos angolanos brancos) às instituições do Estado para facilitar os cidadãos a terem melhores serviços ou facilidade na aquisição de certos documentos.

Por sua vez, o membro do secretariado do Comité Central do PCP e responsável da Secção Internacional, Pedro Carreiro, realçou as excelentes relações de amizade e cooperação com o MPLA em diferentes domínios.

Os políticos angolanos foram igualmente recebidos por Francisco André, secretário Nacional do Partido Socialista para as Relações Internacionais.

Já agora, alguém ouviu Nuno Pedro Santos (PS), Luís Montenegro (PSD), André Ventura (Chega), Rui Rocha (Iniciativa Liberal), Mariana Mortágua (Bloco de Esquerda), Paulo Raimundo (PCP), Rui Tavares (Livre) e Inês Sousa Real (PAN) dizer que 68% da população angolana é afectada pela pobreza, que a taxa de mortalidade infantil é das mais alta do mundo, com 250 mortes por cada 1.000 crianças? Alguém o ouviu dizer que apenas 38% da população angolana tem acesso a água potável e somente 44% dispõe de saneamento básico?

Alguém os ouviu dizer que apenas um quarto da população angolana tem acesso a serviços de saúde, que, na maior parte dos casos, são de fraca qualidade? Alguém os ouviu dizer que 12% dos hospitais, 11% dos centros de saúde e 85% dos postos de saúde existentes no país apresentam problemas ao nível das instalações, da falta de pessoal e de carência de medicamentos?

Alguém os ouviu dizer que 45% das crianças angolanas sofrerem de má nutrição crónica, sendo que uma em cada quatro (25%) morre antes de atingir os cinco anos? Alguém os ouviu dizer que, em Angola, a dependência sócio-económica a favores, privilégios e bens, ou seja, o cabritismo, é o método utilizado pelo MPLA para amordaçar os angolanos?

Alguém os ouviu dizer que, em Angola, o acesso à boa educação, aos condomínios, ao capital accionista dos bancos e das seguradoras, aos grandes negócios, às licitações dos blocos petrolíferos, está limitado a um grupo muito restrito de famílias ligadas ao regime no poder?

Alguém os ouviu dizer que Angola é um dos países mais corruptos do mundo e que tem 20 milhões de pobres?

Ninguém os ouviu dizer qualquer coisa que possa irritar o partido que desgoverna Angola há 48 anos. Dir-se-á, e até é verdade, que esse silêncio é condição “sine qua non” para cair nas graças dos donos do dono do nosso país, até porque todos sabemos que nenhum negócio se faz sem a devida autorização do general João Lourenço.

Portugal consegue assim não o respeito mas a anuência do regime para as suas negociatas. Esquece-se, contudo, de algo que mais cedo ou mais tarde lhes vai sair caro: o regime não é eterno e os angolanos têm memória.

Os angolanos da casta superior que dirige o reino há 48 anos (o MPLA) acreditam que se justifica que Pedro Nuno Santos, Luís Montenegro, André Ventura, Rui Rocha, Mariana Mortágua, Paulo Raimundo, Rui Tavares e Inês Sousa Real agradeçam (mesmo que a despropósito) ao Presidente general João Lourenço. Se o MPLA dizia que José Eduardo dos Santos era o “escolhido de Deus”, estes políticos portugueses devem dizer que João Lourenço é o próprio “Deus”. Portanto, por acção ou omissão, eles dizem.

Aliás, o próprio presidente da República de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, ao elogiar o “projecto de paz, de democracia, de regeneração financeira, de desenvolvimento económico, de combate à corrupção” protagonizado pelo Presidente do MPLA, general João Lourenço, mostrou várias vezes que não sabe o que diz nem diz o que sabe. Mas não está só. Quando se está no Poder todos são bestiais. Quando deixam de estar são, regra geral, bestas. José Eduardo dos Santos que o diga, José Sócrates que o diga.

Todos nos recordamos de, numa intervenção durante um jantar oficial oferecido por João Lourenço, no Palácio Presidencial, em Luanda, Marcelo Rebelo de Sousa o saudar como “o vulto cimeiro de um novo tempo angolano”. Não se terá lembrado de o propor para um Prémio Nobel, mas quando “descobrir” que existem 20 milhões de angolanos pobres… vai propor. Justamente, acrescente-se.

“Vossa excelência protagoniza-o com um projecto de paz, de democracia, de regeneração financeira, de desenvolvimento económico, de combate à corrupção, de afirmação regional e mundial. Nós, portugueses, seguimos com empenho essa aposta de modernização, de transparência, de abertura, de inovação, de acrescida ambição”, afirmou Marcelo Rebelo de Sousa, bem ao estilo dos sipaios coloniais, mas com uma substancial diferença. Estes eram obrigados a bajular, o presidente português não é obrigado a isso. Ou será que é?

Segundo o Presidente português, o general João Lourenço protagoniza “um novo tempo angolano, na lúcida, consistente e corajosa determinação de aproveitar do passado o que se mantém vivo, mas, sobretudo, entender o que importa renovar para tornar o futuro mais possível, mais ambicioso e mais feliz para todos os angolanos”.

Continuemos, para memória futura, com o brilhantismo bacoco de Marcelo. Disse ele que, da parte de Portugal, Angola conta com “o empenho de centenas de milhares que querem contribuir para a riqueza e a justiça social” com o seu trabalho, bem como “das empresas, a começar nas mais modestas, no investimento e no reforço do tecido socioeconómico angolano” e também com “o empenho das instituições públicas portuguesas, do Estado às autarquias locais”.

“Podem contar connosco na vossa missão renovadora e recriadora. Portugal estará sempre e cada vez mais ao lado de Angola”, acrescentou Marcelo Rebelo de Sousa, fazendo aqui e mais uma vez o exercício de passar aos angolanos um atestado de menoridade e matumbez.

Portugal, por sua vez, conta com a “incansável solidariedade” de Angola. “Contamos com os vossos trabalhadores, as vossas empresas, as vossas instituições públicas, a vossa convergência nos domínios bilateral e multilateral. Temos a certeza de que Angola estará sempre e cada vez mais ao lado de Portugal”, prosseguiu Marcelo no seu laudatório e hipócrita exercício de servilismo.

De acordo com o Presidente português, este “novo momento na vida de Angola” coincide com “um novo ciclo” nas relações bilaterais. “E nada nem ninguém nos separará, porque os nossos povos já estabeleceram o seu e o nosso caminho”, considerou Marcelo, sentindo o umbigo aos saltos, alimentado pela esperança de que os portugueses não acordem e os angolanos nunca lhe cobrem a cobardia.

“Porque estamos mesmo juntos, na parceria estratégica, na cooperação económica, financeira, educativa, científica, cultural, social e política. Porque no essencial vemos o mundo e a nossa pertença global e regional do mesmo modo, a pensar na paz, nos direitos humanos, na democracia, no direito internacional, no desenvolvimento sustentável, na correcção das desigualdades”, argumentou aquele que, em matéria de bajulação, bateu todos os recordes anteriores, desde Álvaro Cunhal a Rosa Coutinho, passando por Vasco Gonçalves, José Sócrates, António Costa, Cavaco Silva, Passos Coelho e tantos outros.

No final da sua intervenção, de cerca de sete minutos (que entrará para o “Guinness World Records” por ser o que mais bajulação fez em tão curto espaço de tempo), Marcelo Rebelo de Sousa disse que “a história faz-se e refaz-se todos os dias e nuns dias mais do que noutros”, acrescentando: “Estes que vivemos são desses dias”.

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